Materialismo e Esquecimento do Ser

Por Arthur Dutra

1) Tipos de materialismo:

a) Materialismo físico-ontológico: Hobbes, século XVII

“Tudo o que é essência, ou de algum modo não é corpóreo, é excluído da filosofia”

Tudo o que existe é apenas realidade física. Nem a religião conserva seu caráter filosófico.


b) Materialismo histórico-dialético: Marx e Engels

“O que os indivíduos são depende, pois, das condições materiais de sua produção”.

Até o espírito e suas manifestações dependem da matéria


c) Niilismo de Nietzsche

“Se tudo passa, a transitoriedade é uma qualidade (‘a verdade’) e a duração e a imortalidade são apenas uma ilusão”. Nietzsche

Exclusão da metafísica com a morte simbólica de Deus


d) Desdobramentos do niilismo nietzscheano em Heidegger

“A morte de Deus significa a eliminação do ser supra-sensível e transcendente, a perda e o esquecimento do ser como tal”. G. Reale

O homem mata Deus para servir-se da matéria como meio disponível para a realização de sua vontade de potência. Esta é uma forma extrema de materialismo, pois é a elevação da matéria à categoria de divindade. É a própria doutrina do esquecimento do Ser.


2) Platão e o materialismo

a)      Descoberta do mundo inteligível a partir das observações dos filósofos naturalistas.
b)   O elemento material seria apenas uma concausa dos fenômenos do universo, regidos por Ideias e Princípios Supremos.


- A Segunda Navegação: o acesso ao mundo inteligível

“Chama-se segunda navegação aquela que alguém realiza quando, na ausência de vento, navega com os remos”. Eustásio

“A ‘Segunda Navegação’ platônica constitui uma conquista que assinala, em certo sentido, a etapa mais importante da história do pensamento ocidental, e inaugura a metafísica no sentido mais elevado e mais completo”. G. Reale

Razão: A distinção entre o mundo sensível e o mundo inteligível se baseará na busca do Ser, de uma Razão superior, ou Logoi, que determinará, desde um plano transcendente, o rumo de todos os acontecimentos, bem como será o fator ordenador e harmonizador de toda a desordem, de toda a contradição que informa a matéria.


- Princípios primeiros e supremos, localizados acima das Ideias (estrutura bipolar ordenadora da desordem do universo):

à o Um (de que deriva o vem)
à a Diáde indefinida grande-e-pequena (de que deriva a multiplicidade, a desordem e o Mal)

“Mas o deus de Platão não é a Ordem, e sim o Ordenador, ou seja, a Inteligência que imprime na desordem a ordem, submetendo e subjugando a desordem na medida do possível, de modo que o universo se torne ‘cosmos’, que, e grego, significa justamente ‘ordem’”.

“O significado fundamental da mensagem platônica é, portanto, este: o cosmos só pode ter nascido da ordem impressa à desordem, e é o mais perfeito possível, embora a desordem não esteja de todo domada, uma vez que continua a haver falhas nas consequências negativas do devir”.

3) Crítica de Raymundo de Farias Brito ao materialismo: a Filosofia do Desespero

“Tudo é matéria – proclama a filosofia moderna. E isto é aparentemente uma fórmula vã, mas, em sentido geral, vale por uma revolução e no fundo quer dizer: fez-se de novo o caos e em toda a extensão infinita do espaço estabeleceu-se o império da confusão e da desordem. O mundo fez-se trevas; a vida perdeu todo o sentido e todo o seu valor; e uma noite impenetrável encerrou os horizontes do espírito. Para os que sentem, quer dizer, para os que sofrem, para os que estão sujeitos ao nascimento e à morte, só o sofrimento impõe-se como verdade. O desespero torna-se a única palavra de vida. E uma tristeza mortal invade o coração do homem, inconsciente em face da natureza sensível, mudo e impassível em face do cadáver do espírito e da desordem do cosmos”.

Farias Brito, in “O mundo interior”, p. 106.


4) Terapia sugerida pelos antigos: A justa medida

“Então, a terapia para esse mal que deixa tudo à mercê do múltiplo e da consequente desordem só pode derivar do ato de levar a unidade-na-multiplicidade, e assim criar a ordem e produzir harmonia naquelas coisas que dependem do homem.” G. Reale

5) O Materialismo e o contexto político brasileiro

Ao fim desta exposição, fica um recado bastante oportuno para o Brasil. A disseminação de ideologias de cunho materialista, que têm contribuído para o afastamento do homem brasileiro dos princípios primeiros e supremos de que falou Platão, apresenta resultados nefastos e já bem visíveis. A desordem acarretada pela disseminação do discurso marxista da luta de classes, o tensionamento das relações pessoais, a divisão do país em grupos categorizados são obras daquele ente que deveria ser o apaziguador e mediador dos conflitos: o Estado.

O Brasil é a prova de que o Estado, quando cai nas mãos de grupos políticos orientados por ideologias materialistas, torna-se corrupto e corruptor, desordenado e desordenador, além de perder a capacidade de oferecer paz e de mediar os conflitos com equilíbrio a fim de restaurar a unidade ao povo, unidade esta que é exatamente o centro da lição platônica com o Princípio Supremo do Uno, que veicula o próprio Bem quando é capaz de dar ordem e sentido a uma infinidade de relações aparentemente desordenadas e caóticas.

Neste ponto, portanto, o platonismo tem muito a ensinar ao Estado brasileiro, hoje dominado pelo materialismo marxista, cuja obra vem desgraçando e afastando o povo  da saudável e desejável harmonia que deve imperar entre qualquer povo.

O texto refere-se à análise do capítulo 10 do livro "O Saber dos Antigos", de Giovanni Reale, realizado na última reunião do grupo, em 6 de novembro de 2014